quinta-feira, 5 de novembro de 2020

Um olhar crítico sobre a pandemia

Desde o início da pandemia do novo coronavírus, fomos bombardeados com notícias das consequências dessa situação sem precedentes. Manchetes diárias nos aproximaram da realidade, das vidas perdidas devido ao vírus e dos estragos na economia de inúmeros países em todo globo, números e índices que alertavam para as crises que afetaram diretamente a população, principalmente a camada mais sensível da sociedade. Mas essa realidade não foi um fato comungado de forma uniforme, uma parcela muito pequena da sociedade (praticamente insignificante em quantidade, mas extremamente relevante em influência econômica e política) obteve neste momento ímpar na história da humanidade números e índices completamente diferentes.

Em junho, foi noticiado que Jeff Bezos (fundador e CEO da Amazon) ficou 44 bilhões de dólares mais rico durante a pandemia (cerca de R$245 bilhões, ou seja, quase o valor total da dívida externa brasileira, estimada em R$323 bilhões ao final de 2019). Esse aumento exorbitante, se deu pela valorização das ações de Amazon principalmente neste momento de isolamento social, onde o comércio, ou estava fechado ou operando de maneira reduzida, abrindo então um espaço gigantesco para o e-commerce. “Só no primeiro trimestre, as compras no e-commerce avançaram 32%. Foram 16 milhões de pessoas realizando mais de 50 milhões de compras. É o maior valor registrado em toda a série histórica nesse período e rendeu um faturamento de 20 bilhões de reais”. Analisando sob a ótica do mercado, é natural que em situações adversas como esta que estamos passando, novos modelos de negócios irão surgir e aqueles que se adaptam à nova realidade conseguem sair na frente e ultrapassar as adversidades. Mas a questão que este artigo ousa levantar é: como podemos presenciar essa conjuntura e apenas aceitar que é essa a maneira de como o modelo de mercado funciona?

Não é preciso fazer grandes reflexões éticas ou morais para acreditar que no mínimo é injusto que a mesma pandemia que tirou 400 milhões de empregos ao redor do mundo e ameaça outros 430 milhões de pequenos negócios, foi a mesma que acrescentou 3 trilhões de dólares de valor de mercado para as 100 empresas campeãs do negócio de ações. É impensável que poderemos sustentar uma sociedade tão injusta e desigual assim por muito tempo. Como avalia Katia Maia, diretora executiva da Oxfam Brasil: “Não podemos aceitar que esse modelo econômico, que privilegia alguns poucos bilionários em detrimento de toda a sociedade, continue a ditar as regras. Nosso relatório mostra que essa economia só tem funcionado para um pequeno grupo de pessoas, os super-ricos”.

No Brasil, a situação não poderia ser diferente, ao fim de setembro de 2020 o número de desempregados chegou a 13,5 milhões, uma alta de 33,14% em 5 meses de pandemia, segundo levantamento do IBGE. Já em relação às micro e pequenas empresas, foram mais de 600 mil que fecharam as portas desde o início da pandemia do novo coronavírus. Outros 30% dos empresários precisaram recorrer a empréstimos para manter seus negócios, e destes, 59,2% foram negados pelas instituições financeiras. Ao olharmos os números dos resultados financeiros dos maiores bancos que atuam no Brasil, nota-se uma queda de 31,9% do lucro neste primeiro semestre de 2020 se comparado ao ano passado. “Nos primeiros seis meses do ano, as instituições tiveram ganhos de R$ 40,8 bilhões - R$ 22,4 bilhões no primeiros trimestre e R$ 18,4 bilhões no segundo”.

Mas quando vamos ao fundo da informação, descobrimos que o principal motivo da queda é pelo maior nível de provisionamento para perdas com crédito (ou seja, como medida protetiva, os Bancos aumentaram o valor em caixa para assegurar as operações de crédito). E se formos além, mesmo antes da pandemia se tornar uma realidade, a previsão da rentabilidade das instituições financeiras já era de redução, por conta da queda da taxa básica de juros.

No final de março, ainda no início desta crise de saúde pública, o governo federal anunciou entre outras medidas para proteção da economia, o “Programa Emergencial de Suporte a Empregos” representada pela MP 944, que lançava uma linha de financiamento a juros reduzidos para pequenas e médias empresas com faturamento anual de R$ 360 mil a R$ 10 milhões. O crédito foi repassado para as cooperativas e bancos brasileiros, para então distribuir os financiamentos como forma de ajudar a liquidar a folha de pagamento para evitar demissões em massa. Mas, entretanto, há inúmeros empresários que relatam uma grande dificuldade para conseguir a liberação do crédito, levando semanas ou meses, ou mesmo ficando este inacessível para muitos.

Apesar de estarmos citando dados referentes à realidade brasileira, é redundante afirmar que países com economias semelhantes à do Brasil também estão enfrentando um caminho de muitas dificuldades. Como afirmam alguns economistas “Os países mais pobres lutaram sozinhos contra o coronavírus, empenhando os seus recursos limitados e elevando suas dívidas a patamares insustentáveis”.

Em uma nova década cheia de incertezas, a única afirmação que podemos fazer com certa propriedade, é que o sistema econômico mundial está mostrando cada vez mais sua fragilidade e desigualdade. É provável que a presente pandemia seja o derradeiro alerta para a transformação econômica que a sociedade tanto necessita.

Samuel Ramos (2017101870)

Administração (6° período)



















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