Isaak Soares (*)
Entrou em vigor no começo de 2015, o
novo critério de classificação socieconômico de estratos da ABEP (Associação
Brasileira das Empresas de Pesquisa). O Critério Brasil, como é conhecido, é
uma ferramenta que permite a divisão da população brasileira em estratos
sociais, assim como os modelos montados pelo IBGE e pela FGV. Tal critério se
baseia na quantidade de itens de consumo das famílias brasileiras, e também na
escolaridade da chefia da família, estabelecendo estratos definidos como A1,
A2, B1, B2, C1, C2, D e E. Já o IBGE e a FGV usam os intervalos de renda das
famílias, dividindo em 5 “classes sociais”: A, B, C, D e E. O novo critério foi desenvolvido pela ABEP em
conjunto com os professores Wagner Kamakura, da Rice University, e José Afonso
Mazzon, da USP. Essa estratificação é inovadora em termos mundiais porque
considera o impacto de fatores e da composição familiar na sua
concepção. O estudo realizado pelos dois professores foi premiado em 2013 pelos
prestigiosos Marketing Science Institute
e InternationalJournalofResearch in
Marketing. A nova estratificação, dividida em sete estratos
socioeconômicos, reconhece que o poder aquisitivo pode mudar mesmo que a renda
familiar seja a mesma, dependendo da localização do domicílio e do número de
pessoas na família. (http://www5.usp.br/77674/fea-ajuda-a-criar-novo-criterio-brasil-de-classificacao-economica/)
Comparado
ao critério anterior, há uma diminuição do número de estratos, passando de 8
para 7, as camadas A1 e A2, formam um só estrato A; e os estratos D e E são
analisados em conjunto.
Fonte:
Abep (www.abep.org.br)
As
mudanças feitas para 2015, passam a considerar dados dos 62 mil domicílios
avaliados pela POF (pesquisa de orçamentos familiares do IBGE), incluindo áreas
metropolitanas, urbanas e rurais, enquanto o indicador anterior cobria nove
regiões metropolitanas (Porto Alegre, Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo
Horizonte, Distrito Federal, Salvador, Recife e Fortaleza).
A nova
atualização altera os itens que compõem o critério. Além da inclusão de acesso
a serviços públicos (água encanada e rua pavimentada), na posse de itens
deixaram de ter alguns itens, como: televisão em cores, rádio e videocassete. E
foram incluídos os bens: microcomputador, lava-louças, micro-ondas, motocicleta
e secadora de roupas. Foram mantidos banheiro, empregada doméstica, automóvel,
geladeira, freezer, lava roupas e DVD. O peso para a posse de cada item também
foi alterado. (http://www.ibope.com.br/pt-br/noticias/Paginas/Criterio-Brasil-inicia-2015-com-nova-atualizacao-.aspx)
O critério
Brasil, como é conhecido, é uma ferramenta para auxiliar empresas de pesquisa,
agências de publicidade, veículos de comunicação e demais empresas em seus
processos de segmentar e atuar no mercado de bens de consumo, fornecendo uma
forma de classificação do poder de compra das famílias brasileiras. Como professor de
Marketing e Pesquisa de Mercado, sempre apresento o referido critério aos
alunos para demonstrar sua utilização junto ao marketing. E o que sempre gera
muitas dúvidas. Como por exemplo, os alunos calcularem sua pontuação e não
acreditarem que estejam participando de determinado estrato, seja para cima ou
para baixo. Assim sendo é importante destacar alguns pontos:
Primeiro, Há
varias formas de se medir classes sociais, o que irá depender do posicionamento
epistemológico do pesquisador, da metodologia utilizada e da própria
interpretação do conceito de “classe social”. Assim sendo, pode-se ter
compreensões distintas sobre como “dividir” uma sociedade em classes e a
quantidade destas. Considera-se também que uma classificação social, sempre será
um exercício em cima de uma realidade social, que é mutável e nada exata, o que
já torna difícil a tarefa de conceituar, imagine de medir “classes sociais”. Esta
amplitude do pensar irá permitir visões e divisões diversas sobre uma
estratificação social, mas que não significa a desqualificação de algum dos
métodos de análise. Por exemplo, enquanto o IBGE e a FGV consideram 5 classes,
o critério da ABEP/2015 possui 7, sendo que até o ano passado eram 8 estratos.
Algum deste está errado? Lógico que não. São percepções sobre o mesmo objeto
de análise, que as diferenças permitiram uma melhor compreensão da sociedade
brasileira, do que disputas entre as técnicas. E depois se comparamos os 3
instrumentos, observa-se que há muito mais semelhanças do que distorções.
Segundo, o
critério Brasil não avalia valores, crenças e comportamentos de pessoas em
determinada classe social, mas sim o poder
de compra. Classes sociais permitem ver as diferenças de valores e crenças
que são compartilhados por indivíduos de uma mesma classe. Pode-se dizer que
pessoas que são de camadas superiores de uma sociedade tem um conjunto de
identificações que as distinguem de pessoas de camadas mais populares da
sociedade. Todavia, são necessários pesquisas e instrumentos de análises para
observar mais a miúde tais diferenças. O Critério Brasil não tem como objetivo
medir valores e nem crenças em distintas classes. Seu objetivo é medir a
hierarquia do poder de compra na sociedade brasileira; para isto considera os
bens de consumo e a escolaridade da chefia familiar. Afinal na cultura
brasileira, a escolaridade é uma variável de suma importância para o aumento de
capital cultura, renda e posições sociais; e o que irá refletir no poder de
compra. Isto significa que mais educação, possibilita melhores empregos, o que dão
melhores salários, que permite mais poder de compra.
Dizer que se mede
poder de compra (e não valores) significa dizer que pessoas em camadas próximas
da pirâmide socioeconômica podem ter poder de compra parecido, mas não
necessariamente os mesmos valores. Por exemplo: uma diarista pode estar na
camada C1 e sua patroa pode estar na camada B2, elas podem ter poder de compra
(ou crédito) parecidos para adquirir uma TV de Led, todavia uma pode ter
valores de uma camada popular e a outra, valores de uma classe média. E tais
valores poderão ser pormenorizadamente percebidos no comportamento de compra de
cada uma das consumidoras, do que apenas na posse do bem. Ou seja, é mais fácil
medir o poder de compra, que é uma variável mais objetiva, do que as crenças
que tem uma natureza mais subjetiva.
Assim, considero
mais adequado chamar o critério Brasil como um instrumento para medir estratos socioeconômicos, ao invés de
classes sociais. A ideia de classe social, passa não apenas pelo poder de
compra, mas também pela quantidade de poderes (social, econômico, político e
cultural) que alguém possui na sociedade. O que não é o objetivo do critério
Brasil.
Terceiro, o
critério não é para dizer que uma pessoa é de Classe A ou C, por exemplo; mas
para informar que um indivíduo pesquisado, habita um domicilio que tem um
“poder de compra” relativo a um dos estratos socioeconômicos (A, B1, B2, C, D e
E). É equivocado fazer uma avaliação individual com um instrumento que possuem
a função de uma análise grupal. Assim também, como é errado olhar para alguém e
“apontá-lo” com sendo de determinada classe, visto que dito nos parágrafos
anteriores, o conceito de classe social é mais amplo e ancorado por valores. O mais
correto é dizer que “pela pontuação do critério Brasil, esta pessoa habita um
domicilio classificado socioeconomicamente como sendo A, B1, B2, C1, C2, D ou
E.
Quarto, Em um
país de 190 milhões de habitantes e tantas distinções sociais, torna-se importante
ter um critério de avaliação social, que possa mensurar “todas” as pessoas da
população. Obviamente, que sempre haverá exceções e casos particulares. Um exemplo:
um executivo e um motoboy, onde os 2
não possuem carro, e o primeiro é dono de uma Harley-Davidson e o segundo, tem uma moto de 150 cilindradas, e os
dois acabam tendo a mesma pontuação no quesito moto e nenhuma pontuação no
quesito “automóvel”. Sim... isto acontecerá, mas deve-se lembrar que há outros
indicadores que mostraram onde os mesmos não estão no mesmo estrato. E mesmo
que por alguma eventualidade, o executivo tenha uma pontuação menor do que a
sua real vida cotidiana, e ficando num estrato abaixo, por não ter carro e
possuir uma Harley; mesmo assim será
um caso isolado, uma situação ímpar, o que não inviabiliza o uso do critério
Brasil à toda população. Ou seja, torna-se mais robusto usar a ferramenta em
análise de grupo, do que para verificação de casos pessoais.
Quinto, sendo uma
ferramenta de segmentação para o mercado de bens de consumo, o critério não é o
ponto final do processo de segmentação, mas sim o início dele. Muitos alunos de
Administração e Publicidade, até mesmo profissionais desta área, quando
realizam processos de segmentação para mercados B2C, necessitam de características
demográficas para estabelecer um perfil de segmento. E um parâmetro de renda ou
classe social necessita ser encontrado. Todavia o critério Brasil 2015,
apresenta 7 camadas socioeconômicas; o que não indica dizer que só há, no
máximo, 7 segmentos por renda no país. Pois nesta definição de segmento de
mercado, o critério Brasil é usado com um dos elementos para o estabelecimento
da estratificação social, visto que outras variáveis podem ser usadas para
“lapidar” o segmento estudado, como no caso das variáveis psicográficas (estilo
de vida e outras). Além do mais, conhecendo o mercado com base no critério da
ABEP, o profissional de marketing pode ainda filtrá-lo mais um pouco, como por
exemplo: pessoas de estrato A, com renda familiar mensal acima de R$ 20.000,00.
Ou seja, é um risco fechar a análise de um segmento de mercado só com o
Critério Brasil, deve-se usá-lo cruzando com outras variáveis de segmentação.
Assim, quero aqui
reforçar a importância do País possuir um critério que permita ver suas
diferenças socioeconômicas, e que também se possa perceber as limitações da
ferramenta, sem que com isto venha-se a desqualificar as vantagens operacionais
no seu uso cotidiano na área mercadológica.
Minha experiência, como professor de marketing, mostra que quanto mais
se aprende sobre as diversas formas de considerar “classes sociais”, mais se
amplia o volume da discussão. E o critério Brasil é uma técnica que, se não
permite medirmos os valores sociais, possibilita em muito vermos seus reflexos
por meio da posse de bens de consumo, educação e agora, serviços públicos.
(*) Professor de
Marketing do UNICURITIBA
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